sexta-feira, 6 de junho de 2008

Clube de futebol não é polícia

Após a confusão do último domingo no jogo entre Náutico e Botafogo, o Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) resolveu interditar o Estádio dos Aflitos. O Náutico pode ainda perder o mando de campo por 1 a 10 jogos, além de ter que pagar multa de R$10.000 a R$ 200.000 (veja aqui). O principal artigo em questão é o artigo 213: “Deixar de tomar providências capazes de prevenir e reprimir desordens em sua praça de desporto”.

O problema começou quando o jogador André Luis do Botafogo foi expulso e saiu de campo xingando e fazendo gestos obscenos. O jogador se dirigiu então ao banco de reservas, o que não é permitido pela regra. A polícia tentou levá-lo ao vestiário do Botafogo, mas a porta estava trancada. Após muita confusão, a polícia retirou o jogador do estádio pelo meio da torcida do Náutico.

Pois então. A lei é absurda. O primeiro problema é que ela é genérica demais. Praticamente qualquer coisa pode ser enquadrada no artigo 213. Se for levada ao pé da letra não poderemos mais xingar a mãe do juiz ou provocar a torcida adversária, pois isso “pode causar desordem”. O artigo dá um enorme poder discricionário ao STJD: poder de decidir o que é permitido ou não nos estádios. E qual é a legitimidade que o STJD tem pra decidir esse tipo de coisa?

Segundo lugar, o artigo assume que os clubes são responsáveis pelos seus torcedores. Pelo pouco que entendo de direito, a única pessoa responsável pelos atos de uma pessoa adulta é ela mesma. Tudo bem, pode caber a uma instituição fazer o possível para evitar fraudes, tumultos, crimes, etc. Mas para isso a instituição deve, no mínimo, ter poder de fiscalização ou policiamento. E isso os clubes não têm. Nem o Náutico, nem o Flamengo, nem o Manchester United, nem qualquer clube do mundo. Portanto não podem ser responsabilizados por atos de desordem dos seus torcedores.

Sobra o argumento de que punir o clube é uma maneira de punir o torcedor. Bem, esse argumento é muito fraco, pois pode-se estar punindo uma verdadeira multidão (além do próprio clube) por atos de pessoas isoladas, o que fere qualquer princípio de justiça.

Ora, o STJD está punindo o Náutico pela truculência da polícia militar, e má educação do jogador André Luis do Botafogo. O que poderia ter o Náutico feito? Treinado a polícia? Educado o jogador?

Situação parecida já viveram outros clubes. Só para citar um exemplo recente, o Flamengo foi punido ano passado porque um torcedor jogou uma lata de cerveja no campo. O indivíduo foi imediatamente preso pela polícia com a ajuda de outros torcedores. O que poderia o Flamengo ter feito? Revistado todas as pessoas que entram no Maracanã? Ter posto um policial ao lado de cada torcedor pra pará-los no exato momento em que fossem jogar algo no gramado?

Em 2014 a Copa do Mundo será no Brasil. Pelo mesmo princípio o STJD terá que punir a CBF por qualquer coisa que aconteça nos estádios. Quem viver verá.

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